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Politicamente Incorreto #3: Queimar Lixo Não é Uma Boa Ideia

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Fernanda Cortez, do Menos 1 Lixo; e Marina Colerato, do Modefica, debatem sobre o que aconteceu no universo da política institucional quando o assunto é meio ambiente. A ideia é levantar discussões importantes sobre o que está acontecendo em termos de governo e legislação, como entender as manobras e como podemos atuar para interferir nesse lugar, que parece tão distante, mas na verdade está tão perto de nós. Ouça no Spotify, iTunes ou seu player preferido.

 

 

O Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou no final de abril a implementação do plano de governo para resolver a questão dos lixões (que são considerados inadequados desde a década de 1950) no Brasil. Hoje, o país tem 1091 lixões espalhados por aí, 620 deles só no Nordeste (SNIS-2019). Os lixões são considerados péssimos destinos para o descarte, porque são espaços a céu aberto sem qualquer proteção e controle ambiental, provocando muitos problemas e danos ao meio ambiente e para quem mora por perto.

Na saúde pública, o impacto disso é surpreendente: 50% dos leitos dos hospitais brasileiros são ocupados por pessoas com doenças provenientes da falta de saneamento básico e da gestão de resíduos. Fora toda a contaminação do chorume nos lençóis freáticos e a proliferação de doenças pela presença de mosquitos, baratas e bactérias. A maioria dos lixões ficam em áreas de preservação ambiental e bem longe das cidades, fazendo com que a maior parte da sociedade não veja o tamanho do problema.

O tal Programa Lixão Zero se propõe a dar fim aos lixões do país e promover a destinação ambientalmente correta dos resíduos sólidos urbanos, além de fortalecer a Logística Reversa, elaborar o Plano Nacional de Resíduos Sólidos e potencializar a geração de energia a partir do que é descartado. E aí que o drama acontece.

Além do programa não conter metas a serem alcançadas, a incineração de lixo para geração de energia tem que ser feita com muito cuidado, já que contamina o ar com enormes quantidades de gases tóxicos. A Polônia, por exemplo, é um dos países com maiores níveis de poluição da Europa pela queima de lixo e já enfrenta um problema sério porque não desenvolve o modelo da forma correta. Na conversa, Fê Cortez também comenta outros casos que sinalizam que queimar lixo não é a melhor alternativa.

Além da toxicidade da incineração para a qualidade do ar, por termos um déficit no processo de coleta seletiva, materiais recicláveis também vão para queima, prejudicando a renda das famílias que vivem desse recurso. Queimar lixo também pode gerar um profundo descomprometido da indústria a respeito da logística reversa e do fomento a tecnologias para criação de materiais alternativos e extinção de outros, como o plástico.

Segundo o Panorama de Resíduos Sólidos no Brasil, realizado em 2016 pela Abrelpe (Associação Brasileira Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), 1692 cidades do país não possuem uma iniciativa de coleta seletiva. Em 2017, esse número caiu para 1647. Apesar da queda, 55,2% das cidades da região Centro-Oeste, por exemplo, não possuem nenhum tipo de coleta seletiva.

Ainda segundo os dados do Panorama de 2017, ao ano, cada brasileiro produz, em média, 378 kg de lixo. A geração de resíduos sólidos urbanos em 2017 foi de 78,4 milhões de toneladas, 1% a mais que em 2016. A coleta regular atingiu 91,2% do que foi gerado, isso significa que 7 milhões de toneladas foram coletadas inadequadamente e tiveram destino desconhecido. Esse valor cobriria 6.100 piscinas olímpicas.

Mas o problema não acaba nestes 7 milhões. Cerca de 40,9% do lixo captado pelo sistema de coleta regular é descartado de forma inadequada. Ou seja, 29 milhões de toneladas são enviadas a lixões ou a aterros controlados, que não possuem os sistemas necessários para proteção do solo, das águas e do entorno.

Carlos Silva Filho, diretor da Abrelpe, responsabiliza a falta de recursos dos municípios e a baixa adesão populacional pela estagnação dos números. Segundo ele, as pessoas já sabem que devem separar o lixo, mas não separam. O diretor também sugere ideias já utilizadas por países europeus, como empresas que usam recicláveis como matérias-primas e custeiam toda a estrutura de tratamento do pós-consumo.

Outra opção viável é o desconto na taxa de resíduos para quem recicla mais, já adotada em algumas cidades dos Estados Unidos e na Colômbia. No Brasil, existe o modelo de recompensas, no qual o cidadão recebe bônus na contas de luz, como é o caso do projeto Recicle Mais, Pague Menos em São Paulo e do Light Recicla no Rio.

Ou seja, encaminhar esse resíduo todo pra incineração como forma de acabar com lixões não vai dar conta da complexidade do problema – como já pudemos provar com as atuações anteriores do ministro nesse escopo. Quando Secretário de Meio Ambiente do estado de São Paulo,  Ricardo Salles fechou 43 dos 96 lixões em seis meses. Um ano depois, o problema estava longe de ser resolvido. Segundo reportagem da CBN, o governo estadual fechava os lixões, mas não oferecia qualquer acompanhamento de ocupação e recuperação do espaço. Isso permitiu a invasão dos lixões e o trabalho irregular dos moradores.

Os detalhes do porquê queimar lixo é ruim e quais as alternativas, você ouve dando o play. Aproveita pra se inscrever e receber aviso sempre que subirmos o episódio do mês. 

 
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Mas calma que tem mais. A agenda urbana proposta pelo ministro tem seis fases: gestão de resíduos, áreas verdes urbanas, qualidade do ar, qualidades das águas, saneamento básico e o combate ao lixo marinho. Uma etapa é lançada a cada trinta dias. A primeira foi o Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar, lançado em 22 de março. Entre as 30 ações propostas pelo Plano, estão previstos: projetos de instalação de dispositivos de retenção com redes coletoras em galerias pluviais e barreiras flutuantes em rios e afluentes, estímulo à coleta seletiva e logística reversa nos municípios costeiros, além do investimento em projetos de inovação tecnológica para aproveitamento de plástico retirado dos oceanos.

Segundo a análise do SOS Mata Atlântica, a agenda do combate ao lixo no mar foi o único fator positivo, mas o plano, gestado desde 2007, foi publicado sem coesão e orçamento garantido. A ONG também lembrou que o ministério e o presidente do Ibama (Eduardo Bim) foram no sentido contrário das recomendações técnicas do próprio órgão de fiscalização ambiental e autorizaram o leilão de 7 blocos de petróleo em regiões de alta sensibilidade. E isso envolve o risco de vazamento de óleo do parque Nacional Marinho de Abrolhos, uma das regiões de maior biodiversidade do Oceano Atlântico. Além disso, o Brasil se recusou a assinar o acordo global para limitar o uso do plástico, o que não faz sentido para quem está se dizendo preocupado com a poluição dos mares por… plástico!

Além disso, falamos sobre o desmonte do Ministério do Meio Ambiente, a coletiva dos ex-ministros ainda vivos que já passaram pelo MMA, o perigo que é deixar a proteção da nossa floresta nas mãos dos europeus, a necessidade de transcender a mentalidade extrativista enquanto sociedade colonizada, o cancelamento do cancelamento da Semana do Clima em Salvador, deixamos dicas de livros e séries e, por fim, convidamos todo mundo pra participar da conversa nos comentários aqui e nas nossas redes sociais @menos1lixo e @modefica.

Dicas dessa edição:

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