A Asos, uma das maiores lojas online de moda e beleza do mundo, atualizou sua política de bem estar animal decretando o fim do uso de diversas matérias-primas como seda, penas e plumas, lã mohair e cashmere em todos os produtos comercializados em seu e-commerce até o fim de 2019.
Depois dos anúncios de grandes marcas e e-commerces de luxo como Gucci e Net-À-Porter dando adeus à pele, e diversas marcas, como a Zara, tirando o Angora da sua cadeia produtiva, a inglesa vai mais longe ao banir matérias-primas ainda amplamentes utilizadas pela moda. A nova política, mais ampla e condizente com os tempos atuais, também não permite a comercialização de matérias-primas como chifres, conchas, dentes, ossos e pérolas. Couros considerados exóticos como de crocodilo, píton e avestruz, além de pêlos, incluindo peles de cordeiros da Mongólia e Angora, já não eram comercializados pela empresa.
Certos tipos de couro, lã e outros pêlos de animais considerados subprodutos da indústria de carne podem ser comercializados contanto que atestem fornecedores com boa criação de animais – o que, cá entre nós, sabemos ser praticamente impossível. A política também vai exigir um cuidado redobrado por conta dos compradores da marca para garantir que itens verdadeiros não passem como sintéticos. Porém, a atualização de políticas da Asos mostra como as marcas estão cada vez mais afastando sua imagem do universo da exploração animal.
Matérias-primas de origem animal não são sustentáveis
Outras razões pelas quais marcas estão cada vez mais deixando de usar alguns produtos de origem animal em suas coleções é porque, no fim das contas, essas matérias-primas são 1. difíceis de rastrear e 2. bastante impactantes em termos ambientais. Grupos de luxo, que dependem amplamente dos seus artigos de couro (inclusive os exóticos) como bolsas, carteiras e relógios para continuar nos negócios, estão comprando fazendas de animais para garantir, entre outras coisas, rastreabilidade da matéria-prima. Sem rastreabilidade, as marcas não podem assinar acordos de sustentabilidade e atestar boas práticas na sua cadeia produtiva.
Num universo de fornecedores extremamente descentralizado, com centenas de etapas entre a criação do animal até a pele tratada e pronta para ser utilizada na loja de tecidos, produtos de origem animal estão entre os mais difíceis de serem rastreados. Questione até a marca mais consciente e sustentável que você conhece; mesmo com uma produção enxuta e local, ela jamais saberá com toda a certeza a fazenda de origem do couro que ela usa, por exemplo. Essa pele pode estar (e provavelmente está) linkada com devastação, poluição, crueldade animal e trabalho análogo à escravidão.
Soma-se a isso o fato de que, com uma demanda e pressão crescentes para marcas assinarem acordos de sustentabilidade e acordos globais de menos impacto ambiental, produtos de origem animal são, comprovadamente, mais impactantes que todas as outras matérias-primas e usá-las dificulta o cumprimento dessas promessas. No relatório The Pulse of The Fashion Industry, publicado em 2017 pelo Global Fashion Agenda e a consultoria The Boston Consulting Group, as matérias-primas couro, seda e lã estão entre as 5 mais impactantes ao considerar o início da produção à peça pronta na loja. Sua produção é intensiva em uso de solo, água e químicos, além de estarem diretamente ligadas à eutrofização e contribuição para as mudanças climáticas.
Deixar de ver animais como matéria-prima é um passo importante para sustentabilidade: encontrar, fomentar e desenvolver fibras e tecidos que não dependam da exploração predatória da natureza é o único caminho possível quando o assunto são têxteis.
Um universo de possibilidades para além dos animais (e do plástico)
A ideia, é claro, não é substituir matérias-primas de origem animal por matérias-primas responsáveis por causar impactos na fauna e na flora igualmente devastadores. É por isso que, quando empresas se comprometem a migrar para uma produção sem materiais como seda e lã, é importante o comprometimento também com o uso de matérias-primas, tanto ancestrais quanto tecnológicas, ainda menos impactantes como algodão orgânico ou algodão certificado Better Cotton Iniciative, fibras celulósicas de origem certificada ou soluções inovadoras como o “couro” de laboratório.
É por isso, também, que deixar de ver animais como matéria-prima é um passo importante para sustentabilidade: encontrar, fomentar e desenvolver fibras e tecidos que não dependam da exploração predatória da natureza é o único caminho possível quando o assunto são têxteis. O quanto antes deixarmos essa possibilidade para trás, mais rápido vamos chegar num lugar de harmonia entre a moda e todos os seres.