Ávidos por novidades e sempre correndo atrás das últimas tendências da moda, os fashionistas brasileiros estão começando a se render a esse tipo de consumo. Iniciativas que visam diminuir o descarte de roupas e dar novos significados às peças não param de surgir: Roupateca, Trocaderia, Projeto Graveta e Roupa Livre são apenas algumas delas. Sem falar nos bons e velhos brechós, que estão sendo ressignificados e ganhando clientela, adicionando à sua cartela de clientes pessoas preocupadas com questões ambientais, além daquelas que buscam exclusividade e peças vintage.
Porém, muito mais do que criar experiências de uso compartilhado de roupas e acessórios, a moda é um dos mercados que mais têm recursos e necessidade de criar valor compartilhado. O conceito de Valor Compartilhado se disseminou pelo mundo depois que os pesquisadores da Harvard Michael E. Porter e Mark R. Kramer escreveram um artigo, em 2011, em que defendiam a necessidade de unir atividade empresarial e sociedade, de maneira que todos saiam ganhando. Assim, quando uma empresa identifica uma necessidade presente na base da pirâmide social e cria um produto ou serviço para atender esta necessidade, está praticando o valor compartilhado.
Na moda, temos alguns exemplos de empresas que atuam dessa forma, como a Pants to Poverty, por exemplo. A marca, especializada em criar roupas íntimas de algodão orgânico, trabalha com agricultores indianos ajudando-os a manter o estilo de vida sustentável, algo que havia se perdido desde os anos 70, quando a “revolução agrícola” se instalou na Índia levando os agricultores a abandonar suas tradicionais formas de agricultura e usar pesticidas e fertilizantes químicos, passando a semear sementes desenvolvidas pelas grandes empresas farmacêuticas como Monsanto e Dupont.
Dessa maneira, além de ajudar a garantir o estilo de vida dos agricultores e de sua família, pagando salários justos e investindo nas escolas das regiões onde trabalham, a empresa oferece aos seus clientes um produto exclusivo, limpo e, com isso, é uma das empresas de lingerie mais lucrativas do Reino Unido.
No Brasil, a Catarina Mina é um bom exemplo de negócio que trabalha criando valor compartilhado. A marca, conhecida por desenvolver bolsas em parcerias com artesãs do Ceará, abraçou a cultura do artesanato e esse ano decidiu investir menos em mídia e mais nos recursos humanos. Dessa forma, as crocheteiras têm a segurança da renda mensal, mas trabalham em suas casas, respeitando seu tempo natural, longe da correria do mercado da moda, além de participar efetivamente dos ganhos da empresa. Todo esse jeito belo e justo de fazer, mais do que lucros financeiros, deu à Catarina Mina reconhecimento no mercado e até indicações a prêmios: esse ano a empresa foi indicada nas categorias Pessoas e Ecoera, na primeira edição do Prêmio Ecoera.
De acordo com Porter e Kramer, autores do artigo sobre valor compartilhado, os três pilares para a criação de valor compartilhado são:
1- “Reconceber produtos e mercados”: no lugar de criar demandas de consumo, criar soluções. Ou seja: olhar para dentro e reconhecer as necessidades da sua comunidade.
2- “Redefinir a produtividade na cadeia de valor”: quando a empresa compra localmente, fortalece os fornecedores e acaba beneficiando outras empresas da comunidade.
3- “Promover o desenvolvimento de clusters locais”: uma sociedade enfraquecida limita a demanda por produtos e a oferta de mão de obra, prejudicando a empresa. Portanto, invista em escolas, faça parceria com universidades e dê treinamento adequado aos seus funcionários e às novas gerações, isso só vai melhorar a mão de obra da sua empresa e deixar todo mundo mais feliz.
Não se trata de filantropia ou responsabilidade social, embora esses também sejam importantes e sempre terão seu lugar, mas a ideia do valor compartilhado tem sido apontada pelos futuristas como uma onda renovadora no capitalismo, o famoso “capitalismo consciente”, e uma das grandes formas de levar significado e propósito para as empresas dentro da Nova Economia. Afinal, já está na hora da moda, além de embelezar pessoas, embelezar também o mundo, levando para as sociedades negócios justos e, ao mesmo tempo, lucrativos.
Vídeo da parceria de Stella McCartney com o ITC Ethical Fashion Initiative