O Backstage é o podcast do Modefica para falar sobre moda a partir de diversos pontos de vista e para muito além do que vemos nas passarelas, nas revistas, no Instagram e nas manchetes. Sempre com convidadxs especiais contando sua trajetória, e junto com nossa editora Marina Colerato, o Backstage debate indústria, carreira, questões de gênero e raça, temas quentes e futuro da moda. Ouça no Spotify ou iTunes.
A comunicadora Isadora Meirelles nasceu com um glaucoma congênito no olho esquerdo, prejudicando sua visão e fazendo-a enxergar apenas com o olho direito. Mesmo assim, ela só foi se reconhecer como uma pessoa com deficiência na faculdade. Na infância e adolescência, lembra de ter sido tratada como todas as outras crianças e adolescentes do seu convívio. À época, ela sabia pouco sobre os esteriótipos sociais que costumam recair sobre as pessoas com deficiência, como batalhadora, um ser angelical ou frágil. Foi no início da sua carreira profissional, quando teve contato com um maior número de pessoas incluindo pessoas com deficiência, que Isadora percebeu e descobriu as diversas questões que tangem este universo.
Foi após esse reconhecimento que ela começou a pensar sobre formas de inclusão. Por estar presente de forma tão disseminada na sociedade, e com grande poder imagético, a comunicadora percebeu que a moda, este espaço inacessível para diversos tipos de deficiência, poderia ser, assim como a comunicação, um lugar de atuação. Como ferramenta de autoexpressão, a moda tem poder de fomentar mudanças importantes na percepção da sociedade sobre as pessoas com deficiência, porém tem feito exatamente o contrário. “Muitas vezes, a gente acaba tornando [a moda] inacessível para pessoas com deficiência, que tem uma necessidade muito forte de se auto afirmar, de trazer à tona suas questões de auto estima e representatividade”, explica.
Após fazer o curso de Moda Inclusiva e de Negócios, da Secretaria do Estado da Pessoa com Deficiência, ela usou as redes sociais para conhecer pessoas com deficiência e encontrar microempreendedores e iniciativas que buscavam soluções de moda inclusiva, mas logo viu que movimento em ainda era disperso e pouco fortalecido. Neste contexto surgiu o Coletivo Quem São Elas. Junto com Camila Bueno, Heloisa Rocha, Silvana Louro e Vitória Cuervo, ela criou um banco de pessoas que trabalham com moda inclusiva com objetivo de começar a unir quem atua no campo. O coletivo também tem feito palestras e talks em lugares que nunca antes debateram ou pensaram sobre moda inclusiva.
A moda está preparada?
Mas, afinal, o que falta para a indústria da moda como um todo abraçar a inclusão? Isadora conta sua experiência de participar de campanhas de grandes marcas em datas específicas, como o dia do Braille ou o Dia da Pessoa com Deficiência. A atenção ao corpo com deficiência ainda é muito pautado em campanhas publicitárias em datas específica. Ela pontua outro fator: é difícil tratar da diversidade do corpo com deficiência sendo que as modelagens são muito padronizadas e em série. Neste quesito, as marcas pequenas saem na frente.
Do lado do ensino, Isadora relata que os estudantes estão cada vez mais interessados no tema, até mesmo os que não têm contato direto com pessoas com deficiência. Ela aponta algumas faculdades que já possuem disciplinas focadas em moda inclusiva. Mas reforça: há muito que ser repensado, revisto e mudado. Com um convite junto à nossa editora-chefe, ela pede que mais pessoas pensem no assunto, para que mais possibilidades de soluções para o problema surjam.
Bom para todo mundo
Quando questionada por Marina sobre o que é mais desafiador para quem tem o primeiro contato com esse tema como um todo, Isadora apontou que a rejeição das pessoas em relação à deficiência ainda é muito grande. “Não existe essa coisa de se colocar no papel da outra pessoa”, relata, “são sempre as pessoas com deficiência ou os familiares e cuidadores que acabam se juntando ao movimento”. Isadora ressalta que o medo de ter um tipo de deficiência, como ficar cego, perder os movimentos ou a audição, traz uma repulsa natural. Ela também reforça que a sociedade é ineficiente na inclusão das pessoas com deficiência, ora pondo alguém em um pedestal para chamá-lo de herói por fazer atividades normais, como ir às compras, ora rejeitando ou simplesmente agindo com pena.
Como comunicadora, ela tenta se aproximar das pessoas de outra forma: tentando trazer para o coletivo uma comunicação que preze por acessibilidade e inovação. Ela dá como exemplo o boom do podcast, que usa áudio, além do texto, e acessibiliza os canais digitais para pessoas com deficiência visual. “A gente pode incluir a pessoa com deficiência e mostrar pra sociedade que acessibilidade é um tema que favorece todo mundo”, afirma.