Como muitas pessoas que se afastam de sua cidade natal, eu tenho um grupo de amigos que eu sempre vejo quando eu volto para lá. Pessoas com as quais eu cresci junto e passei pelas dores escolares com, aqueles que estavam lá nos momentos embaraçosos e dolorosos da adolescência. Lembro-me daquele dia frio e chuvoso, quando três de nós fomos até a casa da quarta pessoa, para ver seu bebê recém-nascido.
Ela tinha 21 anos, e mais tarde conseguiu terminar a universidade como uma mãe solo – meu chapéu permanece firmemente estendido para ela. Mas, enquanto estávamos sentados ali, amontoados em torno do mais ínfimo ser humano que eu já tinha visto, minhas outras amigas choravam e falavam sobre o quanto elas estavam “ansiosas para aquele dia”. Eu, por outro lado… não estava. Eu achei o bebê incrivelmente fofo – mas em nenhum momento esse sentimento me fez ter vontade de ter o meu próprio bebê.
O incidente se repetiu há dois anos, quando minha irmã, com nove anos de idade a menos do que eu, deu à luz à minha primeira sobrinha e, um ano depois, à minha segunda sobrinha. A alegria de ser tia é quase demasiado grande demais para ser expressa em palavras, mas a “tia” é onde eu sou feliz. Eu não sinto nada na boca do meu estômago, ou em qualquer outro lugar, me incentivando a migrar para o status de “mãe”.
Infelizmente, ao estar do lado ‘errado’ dos trinta, casada, permanentemente empregada e child-free (não childless. Minha condição é voluntária, ao contrário daqueles que sofrem a dor inimaginável de querer filhos, mas não conseguir tê-los) é uma combinação que raramente passa despercebida. De repente, as pessoas parecem achar que estão no seu direito de fazer perguntas incrivelmente pessoais. Sim, “você está tentando ter um bebê?” é uma questão muito pessoal, invasiva e de natureza sexual. Sem mencionar o que poderia suscitar em alguém que, como mencionado acima, involuntariamente não tem filhos.
E quando eu explico que não, não estamos “tentando” porque não temos certeza de que queremos filhos, me deparo com uma variação das seguintes perguntas
“Você vai mudar de ideia!” (O que me faz pensar: Você mudou de ideia sobre ter seus filhos, então?)
“Mas e se você acabar velha e sozinha?” (É por isso que me casei, então eu tenho alguém para atormentar na velhice)
“Mas é a maior alegria da vida! (Eu vou deixar você apreciá-la, e ser feliz por você, se você me deixar com a maior alegria da minha vida: viajar)
“Tenho certeza de que seu marido seria um pai incrível.” (Ah, nada como uma boa viagem de culpa. Eu tenho certeza que seu companheiro adora este lado de sua personalidade)
Também me disseram que eu iria querer um bebê quando eu encontrasse o “cara certo”. Eu fiz isso, há nove anos, e nada mudou, exceto que eu tinha 200% de certeza de que ele era “o cara certo”. Mas além de ter sido estupidamente sortuda de encontrar o amor da minha vida, todo o resto permaneceu igual. Eu ainda era a mesma pessoa. E entre todas as coisas da vida, tornar-se mãe era algo que eu preferiria não fazer. Como o amigo muito sábio de Elizabeth Gilbert em Comer, Rezar e Amar disse, “ter um bebê é como ter uma tatuagem na testa. É melhor você ter certeza.”
Recentemente, para evitar o confronto, comecei a experimentar diferentes razões para ‘justificar’ o meu status de child-free: eu não posso pagar (verdade), eu sou muito egoísta (bem, também é verdade) e talvez o mais inesperado deles todos: eu sou uma ambientalista.
Os veganos gostam de repetir como a carne e o leite são os maiores vilões ambientais, e isso é obviamente verdade. Mas há um outro fator que está fazendo sua parte: a imensa quantidade de seres humanos. A maior população de todos os tempos está prejudicando muito nosso planeta. A maior parte das piortes tensões no ambiente estão ligadas ao fato de que simplesmente existem muitos seres humanos no planeta. Da poluição do ar e da água ao aterro sanitário e à biodiversidade, tudo se conecta: nossa multiplicação como de coelhos está matando lentamente o planeta. Consumindo, viajando, desperdiçando, superproduzindo, jogando fora: está tudo comendo a saúde já frágil da nossa Terra. À luz disto, chamar quem decide não ter filhos de pessoas imaturas só porque gostamos de manhãs tranquilas no sábado parece um pouco fora da realidade.
Em seu artigo brilhante para o Mind Body Green, a eco blogger Alden Wicker argumenta contra permitir que os seres humanos futuros sofram as consequências da crise ambiental da nossa geração. “Eu não posso proteger meus filhos dos efeitos das mudanças climáticas”, escreve ela, trazendo à mente esta questão pouco considerada: onde as pessoas do futuro viverão quando grande parte do planeta se tornar inabitável devido a desastres naturais decorrentes das condições climáticas?
Com isso em mente, aqueles que me apontam e aqueles que são “egoístas” como eu por serem child-free podem considerar que na verdade, contribuir para o não aumento da população global é a escolha menos egoísta que podemos fazer. É claro, há muitas coisas que você pode fazer para o ambiente como uma pessoa responsável por criar uma criança, incluindo criar um adulto consciente, compassivo que abre o caminho para um futuro melhor – mas, em última análise, se queremos ver a prosperidade do nosso ecossistema, a redução da população é necessária.
Se agora você está sentado em seu computador, pensando, “besteira. Ela só quer gastar todo seu dinheiro consigo própria e é muito preguiçosa para os sacrifícios que vêm com a maternidade, então ela encontrou a desculpa perfeita”, bem, verdade – também. Meu pecado ambiental é que eu adoro viajar. É o que eu gosto mais de fazer e eu faria muito mais se eu tivesse mais do que o dinheiro que eu gosto de gastar comigo mesma. E eu sou definitivamente mais do que um pouca preguiçosa. Não quando se trata de correr para cima colinas ou adentrar noites para fazer esta revista o melhor que ela pode ser, mas em termos de trabalho doméstico e troca de fraldas, eu sou definitivamente mais preguiçosa do que a média.
Eu vou fechar com estas palavras de Alden, com as quais eu concordo completamente: “Dada a escolha entre colocar os olhos em um dos últimos rinocerontes restantes na África ou ver meu filho descer um escorregador de plástico no parque de diversões local, eu escolho o rinoceronte. Sempre escolherei o rinoceronte”.
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Nota da editora: A autora usa o termo child-free para designar quem escolheu não ter filhos enquanto adota o termo childless para quem não pode, por motivos biológicos, ter filhos.
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Texto escrito por Sascha Camilli para Vilda Magazine e traduzido com autorização para o Modefica. Sascha é fundadora e editora da Vilda Magazine, é jornalista internacional de moda e especialista em Relações Públicas de ONGs e projetos sociais com uma paixão por ioga e viagens. Nasceu em Moscou e cresceu em Estocolmo, ela também morou em Los Angeles, Milão, Florença e Londres antes de chegar à sua cidade atual, Brighton, UK.