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Sensível ao Cuidado: a Importância da Empatia nas Construções Ecofeministas

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  • Daniela Rosendo
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"Ecofeminismo: Mulheres e Natureza" é um série de matérias que busca discutir a importância da conexão das mulheres com os seres não-humanos e o meio-ambiente. A série tem como objetivo abordar as questões éticas e morais, além das questões culturais, sociais e econômicas relacionadas ao feminismo, veganismo e ecologia.

modefica-IDENTIDADE-SELO-ECOFEMINISMO“Ecofeminismo: Mulheres e Natureza” é um série de matérias que busca discutir a importância da conexão das mulheres com os seres não-humanos e o meio-ambiente. A série tem como objetivo abordar as questões éticas e morais, além das questões culturais, sociais e econômicas relacionadas ao feminismo, veganismo e ecologia.

Você pode ouvir essa pauta no player abaixo. Todos os textos da série Ecofeminismo: Mulheres e Natureza estão disponíveis para audição no Spotify, iTunes, Google Podcast ou no seu player preferido.

Depois de compreender porque colocamos mulheres, animais e natureza sob o mesmo olhar, em perspectiva feminista e de gênero, identificamos diversas interconexões (empírica, política e conceitual, por exemplo) que nos levam a identificar a mesma lógica de dominação presente em todos os “ismos” de dominação: sexismo, racismo, especismo etc.

A partir do momento no qual se percebe essa lógica que permeia as diferentes formas de opressão, somos chamadas a buscar a coerência entre os diversos movimentos e direitos, seja para humanos ou outros que não humanos. Por isso, a filosofia ecofeminista busca, no campo da ética, uma proposta que deve guiar moralmente nossas relações intra e interespécies. Nesse caminho, encontramos a ética sensível ao cuidado, cunhada pela filósofa ecofeminista Karen J. Warren. Contudo, antes de chegar nela, é preciso entender em que contexto se insere a ética do cuidado.

A ética do cuidado é uma proposta pensada como alternativa a outras formas de se pensar a ética, tradicionalmente posta como imparcial. Um dos estudos marcantes, que propiciam o surgimento da ética do cuidado, é o da psicóloga Carol Gilligan, ao demonstrar, a partir de estudos com meninos e meninas, que existem duas vozes diferentes quando se trata da moralidade: a dos homens e a das mulheres.

[quote text=”A ética do cuidado é uma proposta pensada como alternativa a outras formas de se pensar a ética”  textcolor=”#dfac8f”]

A diferença está na forma pela qual homens e mulheres buscam resolver os conflitos morais. Gilligan identificou que meninos tendem a apelar para um processo impessoal, lógico e legal, enquanto as meninas prezam pela pessoalidade e pela comunicação nas relações. Ambos – meninos e meninas – reconhecem a necessidade de chegar a um acordo, mas os termos são diferentes.

Gilligan foi criticada pelas feministas por supostamente reforçar os estereótipos de gênero e continuar relegando as meninas e mulheres à esfera privada, enquanto as associa ao cuidado. A imparcialidade de meninos e homens remete justamente ao outro lado do dualismo – a esfera pública. Contudo, Gilligan se afasta desse binarismo determinista e defende que o desenvolvimento moral de homens e mulheres pode integrar direitos e responsabilidades, em virtude da descoberta da complementaridade de ambos.

A moralidade baseada nos direitos prioriza a igualdade e a justiça, enquanto a ética da responsabilidade centra-se na equidade e no reconhecimento de diferenças nas necessidades. Dessa forma, a maturidade do sujeito ocorre quando a complementaridade entre as duas moralidades é alcançada. É justamente essa complementaridade que Warren busca com a ética sensível ao cuidado.

[quote text=”A ética da responsabilidade centra-se na equidade e no reconhecimento de diferenças nas necessidades” textcolor=”#dfac8f”]

Warren reconhece que há um debate conflituoso entre justiça e cuidado, mas tenta se afastar dele. O que ela propõe é que cada situação irá determinar qual princípio será moralmente adequado: o racional, imparcial e desinteressado, ou o cuidado e a amizade, por exemplo. Qual princípio é adequado para cada contexto depende do atendimento da condição das práticas de cuidado.

A filósofa chama atenção para o fato de que, no contexto pré-feminista no qual vivemos, agir com base no cuidado pode não responder necessariamente aos padrões de justiça. Nesse sentido, as práticas de cuidado devem orientar a decisão no sentido de manter, promover e aumentar o bem-estar das partes relevantes ou, ao menos, não lhes causar danos desnecessários.

Ao ressaltar que nem todos os conflitos podem ser resolvidos racionalmente sem que haja perda de valor, Warren nos mostra também que mesmo decisões racionalmente orientadas podem não significar necessariamente a melhor decisão para quem a tomou, se não forem considerados os fatores emocionais/parciais. Por isso, Warren entende que a moralidade não deve ser resumida à resolução de conflitos. Ela também mostra que as práticas do cuidado podem auxiliar na prevenção de conflitos, por incluir a observação das realidades local e histórica das situações morais.

[quote text=”As práticas do cuidado podem auxiliar na prevenção de conflitos, por incluir a observação das realidades local e histórica das situações morais” textcolor=”#dfac8f”]

Dessa maneira, a empatia alcança um lugar fundamental na construção dessas novas relações ecofeministas. A empatia passa a ser uma habilidade que permite perceber a situação de vulnerabilidade da outra e do outro, e a partir da qual se busca a orientação de qual é atitude moralmente correta em determinada situação.

Nesse sentido, o universalismo reside na necessidade de cada caso ser analisado em seu próprio contexto, fazendo com que o tratamento igual, em quaisquer circunstâncias, é o que possa vir a ser injusto. Na ética sensível ao cuidado, a empatia tem uma relação estreita com o respeito à igualdade e às diferenças.

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